O conceito corrente da constituição dos
seres humanos é dualista: alma e corpo. Segundo este conceito, a alma é a parte
interior espiritual invisível, enquanto que o corpo é a parte corporal externa
visível. Embora haja algo de certo nisto, contudo, é inexato. Esta opinião vem
de homens caídos, não de Deus. Além da revelação de Deus não há nenhum conceito
seguro. Que o corpo é a cobertura externa do homem é, sem dúvida alguma,
correto, mas a Bíblia jamais confunde o espírito e a alma como se fossem a
mesma coisa. Não só são diferentes em condições, mas também suas naturezas
diferem uma de outra. A Palavra de Deus não divide o homem em duas partes de
alma e corpo. Pelo contrário, trata o homem como um ser tripartido: espírito,
alma e corpo. 1 Tessalonicenses 5:23, 24 d
«E o próprio
Deus de paz vos santifique completamente; e o vosso espírito, e alma e corpo
sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor Jesus
Cristo. Fiel é o que vos chama, e ele também o fará..»
CORPO,ALMA E ESPIRITO-OTIMA EXPLICAÇÃO
Este
versículo mostra claramente que o homem está dividido em três partes. O
apóstolo Paulo se refere aqui à santificação total dos crentes: «vos santifique
completamente». Segundo o apóstolo, como se santifica uma pessoa por completo? Guardando seu espírito, alma e corpo.
Com isso, é
fácil compreender que o conjunto da pessoa compreende estas três partes.
Este
versículo também faz uma distinção entre espírito e alma, pois de outro modo
Paulo teria dito simplesmente «sua alma». Posto que Deus distinguiu o espírito
humano da alma humana, concluímos que o homem está composto, não de dois, mas
sim de três partes: espírito, alma e corpo.
Tem alguma
importância a divisão em espírito e alma? É um assunto de primordial
importância porque afeta tremendamente a vida espiritual do crente. Como um
crente pode compreender a vida espiritual se não conhecer o alcance do
mundo espiritual? Sem compreender isto como pode crescer espiritualmente?
O fracasso em
distinguir entre o espírito e a alma é fatal para a maturidade espiritual. Com
freqüência os cristãos consideram espiritual o que é anímico (ou seja, da
alma), e desta maneira permanecem em um estado anímico e não procuram o que é
espiritual seriamente.
Como
poderemos escapar do fracasso se confundirmos o que Deus dividiu?
O
conhecimento espiritual é muito importante para a vida espiritual.
Acrescentemos, não obstante, que para o crente é de igual importância, ou mais,
ser humilde e estar disposto a aceitar o ensino do Espírito Santo. Se o for, o
Espírito Santo lhe concederá a experiência de dividir espírito e alma, embora
possivelmente não tenha muito conhecimento sobre esta verdade. Por um lado, o
crente mais ignorante, sem o mínimo entendimento da divisão de espírito e alma,
pode, entretanto, experimentar esta divisão na vida real. Por outro lado, o
crente mais informado, conhecedor por completo da verdade sobre espírito e
alma, pode, entretanto, não vivê-la em sua experiência. Muito melhor é o caso
da pessoa que pode ter tanto o conhecimento como a experiência.
No entanto, a
maioria carece desta experiência. Em conseqüência, é bom começar por guiá-los a
que conheçam as diferentes funções do espírito e da alma e em seguida animá-los
a procurar o que é espiritual.
Outras partes
da Bíblia fazem a mesma diferenciação entre espírito e alma.
«Porque a
palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois
gumes, e penetra até a divisão de alma e espírito, e de juntas e medulas, e é
apta para discernir os pensamentos e intenções do coração.» (Hb. 4:12).
Neste
versículo, o escritor divide os elementos não corporais do homem em duas
partes, «alma e espírito». Aqui se menciona a parte corporal através das juntas
e das medulas — órgãos motores e sensoriais. Quando o sacerdote utiliza a faca
para cortar e dividir totalmente o sacrifício, não pode ficar nada oculto.
Inclusive se separam as juntas e as medulas (tutanos). Da mesma maneira o
Senhor Jesus usa a Palavra de Deus sobre seu povo para separá-lo todo, para
penetrar inclusive até a divisão do espiritual, o anímico e o físico. E daqui
se deduz que, posto que se pode dividir a alma e o espírito, devem ser
diferentes em sua natureza. Assim, é evidente aqui que o homem é um composto de
três partes.
A criação do homem
«E formou o
Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou-lhe nas narinas o fôlego da vida;
e o homem tornou-se alma vivente.» (Gn. 2:7).
Quando Deus criou o homem, no princípio o formou com o pó, e em seguida
soprou «o fôlego de vida» em seu nariz. Assim
que o fôlego de vida, que se converteu no espírito do homem, entrou em contato
com o corpo do homem, teve origem a alma. Daí que a alma é a combinação do corpo e do espírito do homem. Por isso a
Bíblia chama o homem «uma alma vivente».
O fôlego de vida se converteu no espírito do homem, quer dizer, o princípio
de vida nele. O Senhor Jesus nos diz que
«é o espírito o que dá vida» (Jo. 6:63). Este fôlego de vida vem do Senhor da
Criação. Entretanto, não devemos confundir o espírito do homem com o Espírito
Santo de Deus. Este difere de nosso espírito humano. Romanos 8:16 explica sua
diferença ao afirmar que «O Espírito mesmo testifica com o nosso espírito que
somos filhos de Deus». O original da palavra «vida» em «fôlego de vida» é chay e
está no plural. Isto pode referir-se ao fato de que o sopro realizado por Deus
produziu uma vida dupla, anímica e espiritual.
Quando o fôlego de Deus entrou no corpo do homem, se converteu no espírito do
homem, mas quando o espírito reagiu com o corpo, se criou a alma. Isto
explica a origem de nossas vidas espiritual e anímica.
Devemos
reconhecer, entretanto, que esse espírito não é a própria vida de Deus, porque
«O Espírito de Deus me fez, e o sopro do Todo-Poderoso me dá vida» (Jó 33:4).
Não é a
entrada no homem da vida incriada de Deus, como tampouco é a vida de Deus que
recebemos na regeneração. O que recebemos no novo nascimento é a própria vida
de Deus simbolizada pela árvore da vida. Mas nosso espírito humano, embora
exista permanentemente, está vazio de «vida eterna».
«Formou o
homem do pó da terra» se refere ao corpo do homem; «soprou em seu nariz o
fôlego de vida» se refere ao espírito do homem ao vir de Deus; e «o homem se
tornou uma alma vivente» se refere à alma do homem quando o corpo foi avivado
pelo espírito e convertido em um homem vivo e consciente de si mesmo. Um homem
completo é uma trindade: composto de espírito, alma e corpo. Segundo Gênesis
2:7, o homem foi feito de só dois elementos independentes, o corporal e o
espiritual. Mas quando Deus pôs o espírito dentro da armação de terra se criou
a alma. O espírito do homem, ao entrar em contato com o corpo morto, produziu a
alma. O corpo separado do espírito estava morto, mas com o espírito, o homem
recebeu a vida. O órgão assim vivificado foi chamado alma.
«O homem se
converteu em uma alma vivente» expressa, não meramente o fato de que a
combinação de espírito e corpo produziu a alma, também sugere que o espírito e
o corpo foram totalmente fundidos nesta alma. Em outras palavras, a alma e o
corpo se combinaram com o espírito, e o espírito e o corpo se fundiram na alma.
«Adão, antes
da queda, não sabia nada desta incessante luta do espírito e da carne, que são
já algo cotidiano para nós. Havia uma perfeita mistura de suas três naturezas
em uma, e a alma, como meio unificador, converteu-se na causa de sua
individualidade, de sua existência como ser distinto»
(Earth's Earliest Age, do Pember).
O homem foi
desenhado como alma vivente porque era ali onde o espírito e o corpo se
encontraram e é através dela que se conhece sua individualidade.
Possivelmente
poderíamos usar uma ilustração imperfeita: joguem umas gotas de tintura em um
copo de água. O tintura e a água se combinarão produzindo uma terceira
substância chamada tinta. De igual maneira os dois elementos independentes do
espírito e o corpo se combinam para converter-se em uma alma humana. (A
analogia falha em que a alma produzida pela combinação do espírito e o corpo se
converte em um elemento independente e indissolúvel como o são o espírito e o
corpo.)
Deus considerou a alma humana como algo único. Como os anjos foram criados como
espíritos, o homem foi criado de maneira predominante como alma vivente. O
homem não só tinha um corpo, um corpo com o fôlego de vida; também se converteu
em uma alma vivente. Por isso veremos mais adiante na Bíblia, que Deus
freqüentemente se refere aos homens como «almas». Por que? Porque o que o homem
é depende de como é sua alma. Sua alma o representa e expressa sua
individualidade. É o órgão da livre vontade do homem, o órgão no qual o
espírito e o corpo estão totalmente fundidos. Se a alma do homem quer obedecer
a Deus, permitirá que o espírito governe o homem conforme o ordenado por Deus.
A alma, se o decidir, também pode reprimir o espírito e tomar algum prazer como
senhor do homem.
Pode-se
ilustrar em parte esta trindade de espírito, alma e corpo com uma lâmpada
elétrica. Dentro da lâmpada, que pode representar o conjunto do homem, há
eletricidade, luz e arame.
O espírito é
como a eletricidade, a alma é a luz e o corpo é o arame. A eletricidade é a
causa da luz, enquanto que a luz é o efeito da eletricidade. O arame é a
substância material para transportar a eletricidade, para manifestar a luz. A
combinação do espírito e do corpo produz a alma, que é única do homem. De
maneira que a eletricidade, transportada pelo arame, é expressa na luz, assim
também o espírito atua sobre a alma, e a alma, por sua vez, se expressa por
meio do corpo.
Entretanto,
devemos lembrar bem que enquanto a alma é o ponto de encontro dos elementos de
nosso ser nesta vida presente, o espírito será o poder dominante em nosso
estado de ressurreição. Porque a Bíblia nos diz: «semeia-se corpo natural,
ressuscita corpo espiritual. Há um corpo natural, e há um corpo espiritual» (1
Co. 15:44). Entretanto, aqui há um ponto vital: nós que fomos unidos ao Senhor
ressuscitado podemos conseguir inclusive agora que nosso espírito governe todo
nosso ser. Não estamos unidos ao primeiro Adão, que foi feito uma alma vivente,
mas sim ao último Adão, que é um espírito vivificador («ou que dá vida») (v.
45).
As
respectivas funções do espírito, da alma e do corpo.
É por meio do
corpo que o homem entra em contato com o mundo material. Daí podemos qualificar
o corpo como a parte que nos faz conscientes do mundo. A alma é formada pelo intelecto, que nos ajuda no
presente estado de existência, e as emoções, que procedem dos sentidos.
Posto que a alma pertence ao próprio eu do homem e revela sua personalidade, é
chamada a parte que tem auto consciência de si mesmo. O espírito é a parte mediante a qual nos comunicamos
com Deus, e só por ela podemos perceber e adorar a Deus. Como nos fala de nossa
relação com Deus, o espírito é chamado o elemento que tem consciência de Deus.
Deus vive no espírito, o eu vive na alma, enquanto que os sentidos
vivem no corpo.
Como já
mencionamos, a alma é o ponto de encontro do espírito e do corpo, porque ali
estão os dois fundidos. Mediante seu espírito o homem mantém relação com o
mundo espiritual e com o Espírito de Deus, recebendo e expressando ambos o poder
e a vida do mundo espiritual. O homem está em contato com o mundo externo
sensorial através de seu corpo, influenciando-o e recebendo suas influências. A
alma se encontra entre estes dois mundos, embora pertença a ambos. Está ligada
ao mundo espiritual através do espírito, e ao mundo material através do corpo.
Também possui o poder da livre vontade e por isso pode escolher entre suas
influências ambientais. O espírito não pode atuar diretamente sobre o corpo.
Necessita um meio, e esse meio é a alma criada pelo contato do espírito com o
corpo. Assim, a alma se encontra entre o espírito e o corpo, mantendo-os
unidos. O espírito pode submeter o corpo através da alma para que obedeça a
Deus. Da mesma maneira o corpo, mediante a alma, pode atrair o espírito a amar
ao mundo.
Destes três
elementos o espírito é o mais nobre porque está unido a Deus. O corpo é o mais
humilde porque está em contato com a matéria. A alma, ao estar entre eles,
une-os e também toma o caráter de ambos e o faz dele. A alma torna possível que
o espírito e o corpo se comuniquem e colaborem. O trabalho da alma é manter
esses dois em seu lugar adequado, para que não percam sua correta relação: quer
dizer, que o mais humilde, o corpo, possa estar sujeito ao espírito, e que o
mais elevado, o espírito, possa governar o corpo por meio da alma. O fator
fundamental do homem é, sem dúvida alguma, a alma. É dependente de que o
espírito lhe dê o que recebeu do Espírito Santo e, assim, depois de ter sido
aperfeiçoada, poder transmitir ao corpo o que recebeu. Então o corpo também
pode compartilhar a perfeição do Espírito Santo e converter-se assim em um
corpo espiritual.
O espírito é
a parte mais nobre do homem e ocupa a área mais profunda de seu ser. O corpo é
a mais humilde e toma o lugar mais exterior. Entre os dois vive a alma,
servindo como seu meio. O corpo é a coberta externa da alma, enquanto que a
alma é o pacote externo do espírito. O espírito transmite seu pensamento à alma
e a alma utiliza o corpo para obedecer à ordem do espírito.
Este é o significado
da alma como mediadora. Antes da queda do
homem, o espírito controlava todo o ser por meio da alma.
O poder da alma é o mais importante, posto que o espírito e o corpo estão
fundidos ali e a têm como sede da personalidade e influência do homem. Antes de que o homem pecasse, o
poder da alma estava completamente sob o domínio do espírito. Em conseqüência,
sua força era a força do espírito. O espírito não pode atuar sobre o corpo por
si mesmo, só fazê-lo através e por intermédio da alma. Isto podemos ver em
Lucas 1:46, 47:
«Disse então
Maria: A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito exulta em Deus meu
Salvador.»
«Aqui a
mudança do tempo verbal mostra que primeiro o espírito produziu gozo em Deus, e
então, comunicando-se com a alma, fez que expressasse o sentimento por meio do
órgão corporal»
(Earth'sEarliest
Age, de Pember).
Repito-o: a alma é a sede da personalidade. A vontade, intelecto
e emoções do homem estão ali. Enquanto que o espírito é usado para comunicar
com o mundo espiritual e o corpo com o natural, a alma se mantém entre ambos e
utiliza seu poder para discernir e decidir se deve predominar o mundo
espiritual ou o natural. Algumas vezes também a mesma alma toma o
controle do homem por meio de seu intelecto, criando desta maneira um mundo de
idéias que predomina. Para que o espírito governe, a alma tem que dar seu
consentimento, pois de outro modo o espírito é incapaz de regular a alma e o
corpo. Mas esta decisão é coisa da alma, porque nela é onde reside a
personalidade do homem.
Verdadeiramente,
a alma é o eixo de todo o ser, porque a vontade do homem lhe pertence. Somente
quando a alma está disposta a assumir uma posição humilde, pode o espírito
dirigir todo o homem. Se a alma se nega a tomar esta posição, o espírito ficará
impotente. Isto explica o significado do livre arbítrio do homem. O homem não é
um autômato que se move segundo Deus queira. Ao contrário, o homem possui um
total poder soberano para decidir por si mesmo. Possui o órgão de sua própria
capacidade volitiva e pode escolher seguir a vontade de Deus ou opor-se a Ele e
seguir a vontade de Satanás. Deus deseja que o espírito, sendo a parte mais
nobre do homem, controle todo o ser. Entretanto, a vontade — a parte crucial da
individualidade — pertence à alma. É a vontade que determina se deve governar o
espírito, o corpo ou inclusive ela mesma. Em vista do fato de que a alma possui
semelhante poder e que é o órgão da individualidade do homem, a Bíblia chama o
homem «alma vivente».
O templo
santo e o homem.
O apóstolo Paulo escreve:
«Não sabeis
vós que sois santuário de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós? Se
alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá; porque sagrado é o
santuário de Deus, que sois vós.» (1 Co. 3:16, 17).
Paulo recebeu revelação para comparar o homem com o templo. Da maneira que
antes Deus vivia no templo, agora o Espírito Santo vive no homem. Comparando
com o templo, podemos ver como se manifestam claramente os três elementos do
homem.
Sabemos que o
templo está dividido em três partes. A primeira é o pátio exterior, que todos
podem ver e visitar. Aqui se oferece toda a adoração externa. Mais adiante está
o Lugar Santo, no qual só podem entrar os sacerdotes e onde se oferece a Deus
azeite, incenso e pão. Estão muito perto de Deus, mas ainda lhes falta porque
estão ainda fora do véu e, em conseqüência, não podem estar diante de sua
própria presença. Deus reside no mais profundo, no Lugar Santíssimo, onde a
escuridão fica eclipsada pela luz brilhante e onde nenhum homem pode entrar.
Embora o Sumo Sacerdote o faça uma vez ao ano, isto indica, no entanto, que
enquanto o véu não seja esmigalhado não pode haver nenhum homem no Lugar
Santíssimo.
O homem
também é o templo de Deus e também tem três partes. O corpo é como o pátio
exterior, e ocupa uma posição externa com sua vida visível para todos. Aqui o
homem deveria obedecer toda ordem de Deus. Aqui o Filho de Deus serve como
substituto e morre pela humanidade. Dentro está a alma do homem, que constitui
a vida interior do homem e abrange a emoção, a vontade e o pensamento. Assim é
o Lugar Santo de uma pessoa regenerada, porque seu amor, vontade e pensamento
estão plenamente iluminados para que possam servir a Deus como o fazia o sacerdote
na antigüidade. Na parte mais interna, atrás do véu, está o Lugar Santíssimo,
no qual não penetrou jamais nenhuma luz humana e que nenhum olho viu. É o
«esconderijo do Altíssimo», o lugar onde vive Deus. O homem não tem entrada
ali, a menos que Deus esteja disposto a rasgar o véu. É o espírito do homem. O
espírito se encontra além da consciência do homem e por cima de sua
sensibilidade. Aqui o homem se une e se comunica com Deus.
Não há abajur
ou luz alguma no Lugar Santíssimo, porque Deus vive ali. No Lugar Santo há o
candelabro de sete braços. E o pátio exterior recebe a luz do dia. Todos estes
servem de imagens e sombras para uma pessoa regenerada. Seu espírito é como o
Lugar Santíssimo, onde vive Deus, onde tudo se faz por fé, além da visão, sentido
ou compreensão do crente. A alma se assemelha ao Lugar Santo, que está
abundantemente iluminado com muitos pensamentos e preceitos racionais, muito
conhecimento e compreensão sobre as coisas do mundo material e o das idéias. O
corpo é comparável ao pátio exterior, claramente visível para todos. Todos
podem ver as ações do corpo.
A ordem que
Deus nos apresenta é inequívoca: «seu espírito e alma e corpo» (1 Ts. 5:23).
Não é «alma e espírito e corpo», nem tampouco é «corpo e alma e espírito». O
espírito é a parte preeminente e por isso é mencionado em primeiro lugar. O
corpo é a parte mais humilde e em conseqüência é mencionado no final. E a alma
está no meio e por isso é mencionada entre as outras duas.
Tendo visto
agora a ordem de Deus, podemos apreciar a sabedoria da Bíblia ao comparar o
homem com um templo. Podemos reconhecer a perfeita harmonia que existe, entre o
templo e o homem quanto à ordem e ao valor.
O serviço do
templo funciona segundo a revelação no Lugar Santíssimo. Todas as atividades do
Lugar Santo e do pátio exterior estão reguladas pela presença de Deus no Lugar
Santíssimo. Este é o setor mais sagrado, o lugar ao qual convergem e se apóiam
as quatro esquinas do templo. Pode nos parecer que no Lugar Santíssimo não se
faz nada porque está completamente às escuras. Todas as atividades se realizam
no Lugar Santo, e inclusive as atividades do pátio exterior são controladas
pelos sacerdotes do Lugar Santo. No entanto, todas as atividades do Lugar Santo
na realidade são dirigidas pela revelação no absoluto silêncio e paz do Lugar
Santíssimo.
Não é difícil
perceber a aplicação espiritual disto. A alma, o órgão de nossa personalidade,
compõe-se de pensamento, vontade e emoção. É como se a alma fosse o diretor de
todas as ações, porque o corpo segue seu direcionamento. Antes da queda do
homem, entretanto, apesar de suas muitas atividades, a alma era governada pelo
espírito. E esta é a ordem que Deus quer ainda: primeiro o espírito, depois a
alma, e finalmente o corpo.
É imperativo
que um crente saiba que tem um espírito, posto que, como logo veremos, toda
comunicação com Deus tem lugar ali. Se o crente não discernir seu próprio
espírito, sempre ignorará a maneira de comunicar-se com Deus no espírito.
Facilmente substitui as obras do espírito com os pensamentos e emoções da alma.
Dessa maneira se auto-limita ao mundo exterior, incapaz para sempre de alcançar
o mundo espiritual.
1 Coríntios
2:11 fala do espírito do homem que está «nele».
2 Coríntios
5:4 menciona «meu espírito».
Romanos 8:16
diz «nosso espírito».
1 Coríntios
14:14 utiliza «meu espírito».
1 Coríntios
14:32 fala dos «espíritos dos profetas».
Provérbios
25:28 se refere a «seu próprio espírito».
Hebreus 12:23
consigna «os espíritos dos justos».
Zacarias 12:1
afirma que «o Senhor... formou o espírito do homem dentro dele».
Estes
versículos demonstram claramente que os seres humanos possuem, com efeito, um
espírito humano. Este espírito não é sinônimo de nossa alma nem é tampouco o
Espírito Santo.
Adoramos a
Deus neste espírito.
Segundo os
ensinamentos da Bíblia e a experiência dos crentes, pode-se dizer que o
espírito humano compreende três partes. Ou, expresso de outro modo, se pode
dizer que tem três funções principais. Estas são a consciência, a intuição e a
comunhão.
A consciência
é o órgão que discerne; distingue o bom e o mau. Entretanto, não o faz por meio
da influência do conhecimento armazenado na mente, mas sim com um espontâneo
julgamento direto. Frequentemente nosso raciocínio justifica o que nossa
consciência julga. O trabalho da consciência é independente e direto, pois não
se submete às opiniões do exterior. Se a obra do homem for má, a consciência
levantará sua voz acusatória.
A intuição é
o órgão sensitivo do espírito humano. É tão diametralmente diferente do sentido
físico e do sentido anímico que é chamada intuição. A intuição suporta uma
sensibilidade direta independente de qualquer influência exterior. Esse
conhecimento que nos chega sem nenhuma ajuda do pensamento, da emoção ou da
vontade é intuitivo. «Sabemos» por meio de nossa intuição, e nossa mente nos
ajuda a «compreender». As revelações de Deus e todos os movimentos do Espírito
Santo são perceptíveis para o crente através da intuição. Em conseqüência, um
crente deve levar em consideração dois elementos: a voz da consciência e o
ensino da intuição.
A comunhão é
a adoração a Deus. Os órgãos da alma são incompetentes para adorar a Deus. Não
podemos receber Deus com nossos pensamentos, sentimentos ou intenções, porque
unicamente podemos conhecê-Lo diretamente em nossos espíritos. Nossa adoração a
Deus e as comunicações de Deus conosco acontecem diretamente no espírito. Têm
lugar no homem interior», não na alma ou no homem exterior.
Assim,
podemos concluir que estes três elementos, consciência, intuição e comunhão,
estão profundamente inter-relacionados e funcionam coordenados. A relação entre
consciência e intuição é que a consciência julga segundo a intuição; condenando
toda conduta que não siga as diretrizes dadas pela intuição. A intuição está
relacionada com a comunhão ou adoração em que Deus se dá a conhecer ao homem
pela intuição e lhe revela sua vontade também por meio da intuição. Nem a
expectativa nem a dedução nos dão o conhecimento de Deus.
Nos
versículos seguintes, separados em três grupos, pode-se observar rapidamente
que nossos espíritos possuem a função da consciência (note-se que não dissemos
que o espírito é a consciência), a função da intuição (ou sentido espiritual) e
a função da comunhão (ou adoração).
A) A função
da consciência no espírito do homem.
«O Senhor teu
Deus lhe endurecera o espírito» (Dt. 2:30).
«Salva os
contritos de espírito» (Sl. 34:18).
«Renova em
mim um espírito estável» (Sl. 51:10).
«Tendo Jesus
dito isto, turbou-se em espírito» (Jo. 13:21).
«Revoltava-se
nele o seu espírito, vendo a cidade cheia de» (At. 17:16).
«O Espírito
mesmo testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus» (Rm. 8:16).
«Ainda que
ausente no corpo, mas presente no espírito, já julguei, como se estivesse
presente» (1 Co. 5:3).
«Não tive
descanso no meu espírito» (2 Co. 2:13).
«Porque Deus
não nos deu o espírito de covardia» (2 Tm. 1:7).
B) A função
da intuição no espírito do homem.
«O espírito,
na verdade, está pronto» (MT. 26:41).
«Jesus logo
percebeu em seu espírito» (Mc. 2:8).
«Suspirando
profundamente em seu espírito» (Mc. 8:12).
«comoveu-se
profundamente em espírito» (Jo. 11:33).
«Paulo estava
constrangido no espírito» (At. 18:5).
«Sendo
fervoroso de espírito» (At. 18:25).
«Constrangido
no meu espírito, vou a Jerusalém» (At. 20:22).
«Qual dos
homens entende as coisas do homem, senão o espírito do homem que nele está?» (1
Co. 2:11).
«Reconfortaram
o meu espírito assim como o vosso» (1 Co. 16:18).
«O seu
espírito tem sido reconfortado por vós todos» (2 Co. 7:13).
C) A função
da comunhão no espírito do homem.
«Meu espírito
exulta em Deus meu Salvador» (Lc. 1:47).
«Os
verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade» (Jo. 4:23).
«A quem sirvo
em meu espírito» (Rm. 1:9).
«Servirmos...
em novidade de espírito» (Rm. 7:6).
«Recebestes o
espírito de adoção, pelo qual clamamos: Aba, Pai!» (Rm. 8:15).
«O Espírito
mesmo testifica com o nosso espírito» (Rm. 8:16).
«o que se une
ao Senhor é um só espírito com ele.» (1 Co.6:17).
«cantarei com
o espírito» (1 Co. 14:15).
«Se tu
bendisseres com o espírito» (1 Co. 14:16).
«E levou-me
em espírito» (Ap. 21:10).
Por estes
versículos podemos saber que nosso espírito possui pelo menos estas três
funções. Apesar dos homens não regenerados ainda não terem vida, mesmo assim
possuem estas funções (mas sua adoração é dirigida a espíritos malignos).
Algumas pessoas manifestam mais que estas funções, enquanto outras manifestam
menos. Isto, entretanto, não implica que não estejam mortos em pecados e
transgressões. O Novo Testamento não considera os possuidores de uma
consciência sensível, uma grande intuição ou uma tendência ou um interesse
espirituais como salvos. Estas pessoas só nos demonstram que, além do
pensamento, a emoção e a vontade de nossa alma, também temos um espírito. Antes
da regeneração o espírito está separado da vida de Deus. Só depois daquela
viverá em nossos espíritos a vida de Deus e do Espírito Santo. E então serão
vivificados para ser instrumentos do Espírito Santo.
Nossa meta ao
estudar a importância do espírito é nos capacitar para compreender que, como
seres humanos, possuímos um espírito independente. Este espírito não é a mente
do homem, sua vontade ou sua emoção. Ao contrário, abrange as funções da
consciência, da intuição e da comunhão. É no espírito onde Deus nos regenera,
nos ensina e nos guia a seu repouso. Mas é triste ter que dizer que, devido aos
longos anos de domínio da alma, muitos cristãos sabem muito pouco de seu
espírito. Deveríamos tremer diante de Deus e lhe pedir que nos ensine através
da experiência o que é espiritual e o que é anímico.
Antes que o
crente nasça de novo, seu espírito fica tão submerso e envolto por sua alma que
lhe é impossível distinguir se algo sai da alma ou do espírito. As funções
deste se misturaram com as daquela. Além disso, o espírito perdeu sua função
original — sua relação com Deus — porque está morto para Deus. Poderia parecer
que se converteu em um acessório da alma. E ao crescer e fortalecer o
pensamento, a emoção e a vontade, as funções do espírito ficam tão eclipsadas
que são quase ignoradas. É por isto que terá que fazer a obra de separação
entre alma e espírito quando o crente tiver sido regenerado.
Ao investigar
as Escrituras parece realmente que um espírito regenerado funciona da mesma
maneira que o faz a alma. Os seguintes versículos o ilustram:
«Seu espírito
estava perturbado» (Gn. 41:8).
«que é
imprudente de espírito exalta a loucura» (Pv. 14:29).
«Um espírito
abatido seca os ossos» (Pv. 17:22).
«Os que erram
em espírito» (Is. 29:24).
«E gemerão
pela angústia de espírito» (Is. 65:14).
«Seu espírito
se endureceu» (Dn. 5:20).
Estes
versículos nos mostram as obras do espírito não regenerado e nos indicam o quão
parecidas são suas obras com as da alma. O motivo de não mencionar a alma mas
sim o espírito é mostrar o que tem ocorrido no mais profundo do homem.
Descobre-se de que maneira a alma do homem chegou a influenciar e a controlar
completamente o seu espírito, obtendo com isto a manifestação das obras da
alma. Ainda assim o espírito ainda existe, porque estas obras saem do espírito.
Embora continue governado pela alma, o espírito não deixa de ser um órgão.
Além de possuir um espírito que lhe permite ter uma comunicação íntima com
Deus, o homem também tem uma alma, a consciência de si mesmo. A operação da
alma o faz ser consciente de sua existência. É a sede de nossa personalidade.
Os elementos que nos fazem humanos pertencem à alma. O intelecto, os ideais, o
amor, a emoção, o discernimento, a capacidade de escolher, a decisão, etc., não
passam de diferentes experiências da alma.
Já foi
explicado que o espírito e o corpo estão fundidos na alma, a qual, a sua vez,
forma o órgão de nossa personalidade. É por isso que em algumas ocasiões a
Bíblia chama ao homem «alma», como se o homem só possuísse este elemento. Por
exemplo, Gênesis 12:5 fala das pessoas como «almas».
E quando Jacó
levou a toda sua família ao Egito, diz que «todas as almas da casa do Jacó que
entraram no Egito eram setenta» (Gn. 46:27).
No original
da Bíblia há numerosos casos em que se usa «alma» em lugar de «homem». Isto se
deve a que a sede e a essência da personalidade é a alma.
Compreender a
personalidade de um homem é compreender sua pessoa. A existência, as
características e a vida de um homem se encontram todas na alma. Em
conseqüência a Bíblia chama ao homem «uma alma».
O que
constitui a personalidade do homem são as três faculdades principais de
vontade, pensamento e emoção.
A vontade é o
instrumento de nossas decisões e revela nosso poder de escolha. Expressa nosso
consentimento ou nossa negativa, nosso «sim» ou nosso «não». Sem ele o homem
fica reduzido a um autômato.
A mente, o
instrumento de nossos pensamentos, manifesta nosso poder intelectual. É a fonte
da sabedoria, do conhecimento e do raciocínio. Sua ausência faz que um homem
seja tolo e inepto.
O instrumento
de nossas simpatias e antipatias é a faculdade da emoção. Por meio dela podemos
expressar amor ou ódio e nos sentir alegres, zangados, tristes ou felizes. Sua
escassez fará o homem insensível como a madeira ou a pedra.
Um cuidadoso
estudo da Bíblia nos levará à conclusão de que estas três faculdades básicas da
personalidade pertencem à alma. Há muitas passagens bíblicas, e não é possível
citá-las todas. Daí que só podemos enumerar uma breve seleção das mesmas.
A) A
faculdade da vontade da alma
«Não me
entregues à vontade (original, "alma") de meus adversários» (Sl.
27:12).
«Não o
entregarás à vontade (original, "alma") de seus inimigos» (Sl. 41:2).
«Te entreguei
à vontade (original, "alma") dos que te odeiam» (Ez. 16:27).
«Deixá-la-ás
ir à sua vontade (original, "alma")» (Dt. 21:14).
«Eia!
cumpriu-se o nosso desejo! (original, "alma")» (Sl. 35:25).
«Ou faz um
voto para ligar-se ele mesmo (original, "alma") com uma obrigação»
(Nm. 30:2).
«Disponde,
pois, agora vossa mente e vosso coração (original, "alma") para
buscardes ao Senhor vosso Deus» (1 Cr. 22:19).
«Eles desejam
e elevam sua alma por voltar a viver ali» (Jr. 44:14).
«Nessas
coisas a minha alma recusa tocar» (Jó 6:7).
«Minha alma
escolheria antes a estrangulação, e a morte do que estes meus ossos» (Jó 7:15).
Aqui
«vontade» ou «coração» assinalam à vontade humana. — Dispor o coração», «elevar
sua alma», «negar-se», «preferir», são, todas, atividades da vontade e têm sua
origem na alma.
B) A
faculdade do intelecto ou a mente da alma
«E o desejo
dos seus corações, juntamente com seus filhos e suas filhas» (Ez. 24:25).
«Não é bom
uma alma agir sem refletir» (Pv. 19:2).
«Até quando
encherei de cuidados (siríaco, hebreu: suportar os conselhos) a minha
alma?» (Sl. 13:2).
«Suas obras
são maravilhosas e minha alma as conhece bem» (Sl. 139:14).
«Minha alma
ainda os conserva na memória» (Lm. 3:20).
«O
conhecimento será aprazível à tua alma» (Pv. 2:10).
«Guarda a
verdadeira sabedoria e o bom siso; assim serão elas vida para a tua alma» (Pv.
3:21, 22).
«Sabe que é
assim a sabedoria para a tua alma» (Pv. 24:14).
Aqui
«conhecimento», «conselho», «elevar», «pensar», «refletir», «sabedoria» etc.,
existem como atividades do intelecto ou da mente do homem, as quais a Bíblia
nos diz que provêm da alma.
C) A
faculdade da emoção da alma
1) EMOÇÕES DE
AFETO
«A alma de
Jônatas se uniu à alma de David, e Jônatas o amou como à sua própria alma» (1
Sm. 18:1).
«Você a quem
ama minha alma» (Ct. 1:7).
«Minha alma
engrandece ao Senhor» (Lc. 1:46).
«Sua vida
detesta o pão, e sua alma a comida deliciosa» (Jó 33:20).
«Os que a
alma do David odeia» (2 Sm. 5:8).
«Minha alma
se zangou com eles» (Zc. 11:8).
«Amarás ao
Senhor teu Deus... com toda tua alma» (Dt. 6:5).
«Minha alma
está cansada da vida» (Jó 10:1).
«Sua alma
detesta toda classe de comida» (Sl. 107:18).
2) EMOÇÕES DE
DESEJO
«Por tudo o
que te pedir a tua alma» (Dt. 14:26).
«O que possa
dizer sua alma» (1 Sm. 20:4).
«Minha alma
suspira! sim, desfalece pelos átrios do Senhor» (Sl. 84:2).
«O desejo de
sua alma» (Ez. 24:21).
«Tanto te
deseja minha alma, Oh Deus» (Sl. 42:1).
«Minha alma
suspira por ti de noite» (Is. 26:9).
«Minha alma
está contente» (Mt. 12:18).
3) EMOÇÕES DE
SENTIMENTOS E SENSAÇÕES
«Além disso
uma espada transpassará sua própria alma» (Lc. 2:35).
«Todo o povo
estava amargurado na alma» (1 Sm. 30:6).
«Sua alma
está em amargura» (2 Rs.4:27).
«Sua alma se
moveu de compaixão por causa da desgraça de Israel» (Jz. 10:16).
«Quanto tempo
atormentará minha alma» (Jó 19:2).
«Minha alma
exultará em meu Deus» (Is. 61:10).
«Alegra a
alma de seu servo» (Sl. 86:4).
«Sua alma se
deprimiu em seu interior» (Sl. 107:5).
«por que
estás abatida, Oh minha alma» (Sl. 42:5).
«Volta, Oh
minha alma, a seu descanso» (Sl. 116:7).
«Minha alma
se consome de desejo» (Sl. 119:20).
«Doçura para
a alma» (Pv. 16:24).
«Deixa que
tua alma se deleite na gordura» (Is. 55:2).
«A minha alma
está triste até a morte» (Mt. 26:38).
«afligia
todos os dias a sua alma justa» (2 Pe. 2:8).
Nestas
observações sobre as diversas emoções do homem podemos descobrir que nossa alma
é capaz de amar e de odiar, de desejar e de aspirar, de sentir e de perceber.
Neste breve
estudo bíblico se torna evidente que a alma do homem possui a parte conhecida
como vontade, a parte conhecida como mente ou intelecto e a parte conhecida
como emoção.
A vida da
alma
Alguns eruditos
bíblicos nos assinalam que no grego se empregam três palavras diferentes para
designar «a vida»:
1) BIOS
2) psyche
3) zoe
Todas
descrevem a vida, mas comunicam significados muito diferentes.
BIOS faz
referência ao meio de vida ou sustento. Nosso Senhor Jesus usou esta palavra
quando elogiou à mulher que atirou no tesouro do templo todo seu sustento.
Zoe é a vida
mais elevada, a vida do espírito. Sempre que a Bíblia fala da vida eterna
utiliza esta palavra.
Psyche se
refere à vida animada do homem, a sua vida natural ou vida da alma. A Bíblia
emprega este termo quando descreve a vida humana.
Observemos
agora que as palavras «alma» e «vida da alma» na Bíblia são uma e a mesma no
original. No Antigo Testamento a palavra hebréia para «alma» — nephesh — se
utiliza também para «vida da alma». Por conseguinte, o Novo Testamento usa a
palavra grega psyche para «alma» e «vida da alma». Por isso sabemos que «a
alma» não só é um dos três elementos do homem, mas sim também é a vida do
homem, sua vida natural. Em muitos lugares da Bíblia se traduz «alma» por
«vida».
«Somente que
não comam a carne com sua vida, quer dizer, seu sangue» (Gn. 9:4,5).
«A vida da
carne está no sangue» (Lv. 17:11).
«Morreram os
que procuravam a morte do menino» (Mt. 2:20).
«É lícito no
sábado salvar a vida ou tirá-la?» (Lc. 6:9).
«Os que têm
exposto as suas vidas pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo» (At. 15:26).
«Em nada
tenho a minha vida como preciosa para mim» (At. 20:24).
«Para dar sua
vida como um resgate por muitos» (Mt. 20:28).
«O bom pastor
sacrifica sua vida pelas ovelhas» (Jo. 10:11,15, 17).
A palavra
«vida» nestes versículos é «alma» no original. Traduziu-se assim porque do
contrário seria difícil compreendê-la. Verdadeiramente a alma é a mesma vida do
homem.
Como já
mencionamos, «a alma» é um dos três elementos do homem. «A verdade da alma» é a
vida natural do homem, a que o faz existir e o vivifica. É a vida pela qual
vive o homem atualmente, é o poder pelo qual o homem é o que é. Como a Bíblia
aplica nephesh e psyche à alma e à vida do homem, é evidente que embora
distintas não são separáveis. São distinguíveis, dado que em certos lugares
psyche (por exemplo) é traduzida por «alma» ou «vida». Não se podem
intercambiar as traduções. Por exemplo, «alma» e «vida» em Lucas 12:19-23 e em
Marcos 3:4 são na realidade a mesma palavra no original, mas as traduções com a
mesma palavra em outras línguas não teria sentido. Entretanto são inseparáveis
porque as duas estão completamente unidas no homem. Um homem sem alma não vive.
A Bíblia nunca nos diz que um homem natural possua outra vida que não seja a da
alma. A vida do homem só é a alma, que impregna o corpo.
Posto que a
vida está unida ao corpo, passa a ser a vida do homem. A vida é o fenômeno da
alma.
A Bíblia
considerou o corpo presente do homem como um «corpo anímico» (1 Co. 15:44
original), porque a vida do corpo que temos agora é a da alma. assim, a vida do
homem é simplesmente uma expressão da composição de suas energias mentais,
emocionais e volitivas. No mundo natural a «personalidade» abrange estas
diferentes partes da alma, mas nada mais. A vida da alma é a vida natural do
homem.
Reconhecer
que a alma é a vida do homem é um fato muito importante porque tem muito a ver
com o tipo de cristãos que chegaremos a ser: espirituais ou anímicos. Isto o
explicaremos mais à frente.
A alma e o eu
do homem
Dado que
vimos que a alma é a sede de nossa personalidade, o órgão da vontade e a vida
natural, podemos deduzir facilmente que esta alma é também o «autêntico eu», o
eu mesmo. Nosso eu é a alma. Isto também se pode demonstrar com a Bíblia. Em
Números 30, a frase «atar-se» aparece dez vezes. No original é «atar sua alma».
Isto nos leva a compreender que a alma é nosso próprio eu. Em muitas outras
passagens da Bíblia encontramos a palavra «alma» traduzida por «eu».
Por exemplo:
«Nem neles
vos contaminareis» (Lv. 11:43).
«Não vos
contaminareis» (Lv. 11:44).
«Por si e
pela sua descendência» (Et. 9:31).
«Oh tu, que
te despedaças na tua ira» (Jó 18:4).
«justificava
a si mesmo» (Jó 32:2).
«Mas eles
mesmos caem cativos» (Is. 46:2).
«O que todos
(original, "toda alma") devam comer, isso só o pode preparar você»
(Êx. 12:16).
«Quem mata a
alguma pessoa (original, "alguma alma") sem intenção» (Nm. 35:11,15).
«Me deixem
(original, "deixem a minha alma") morrer a morte dos justos» (Nm.
23:10).
«Quando
qualquer (original, "qualquer alma") leve uma oferenda de cereais»
(Lv. 2:1).
«Hei-me...
tranqüilizado» (Sl. 131:2).
«Não pensem
que no palácio do rei vão (original, "sua alma vai") escapar» (Et.
4:13).
«O Senhor
Deus jurou por Ele mesmo» (original, "jurado por sua alma") (Am.
6:8).
Esses textos
do Antigo Testamento nos dizem de diferentes maneiras que a alma é o próprio eu
do homem.
O Novo
Testamento nos transmite a mesma impressão. — «Almas», no original, traduziu-se
por «oito pessoas» em 1 Pedro 3:20 e como «duzentas e setenta e seis pessoas»
em Atos 27:37. A frase de Romanos 2:9, traduzida como «todo ser humano que faz
o mal», no original é «toda alma de homem que faz o mal». Por isso, advertir à
alma de um homem que faz o mal é advertir ao malvado. Em Tiago 5:20 se
considera salvar uma alma como salvar a um pecador. E Lucas 12:19 fala das
palavras de satisfação que o néscio rico dirigia a sua alma como se estivesse
falando consigo. Assim, está claro que a Bíblia em conjunto contempla a alma do
homem ou a vida da alma como o próprio homem.
Podemos
encontrar uma confirmação disso nas palavras de nosso Senhor Jesus consignadas
em dois diferentes Evangelhos.
Mateus 16:26
diz: «Pois que aproveita ao homem se ganhar o mundo inteiro e perder a sua vida
(phyche)?» «Ou que dará um homem em troca de sua vida (phyche)?»
Enquanto que
Lucas 9:25 o explica assim: «Pois, que aproveita ao homem ganhar o mundo
inteiro, e perder-se a si mesmo (eau-tonj)?»
Ambos os
escritores do Evangelho deixam perseverança do mesmo, mas um usa «vida» (ou
«alma») enquanto que o outro usa «ele mesmo». Isto significa que o Espírito
Santo está utilizando Mateus para explicar o significado de «ele mesmo» em
Lucas e a Lucas para explicar o significado de «vida» em Mateus. A alma ou a
vida do homem no próprio homem, e vice-versa.
Este estudo
nos permite deduzir que para sermos homem devemos possuir o que há na alma do
homem.
Todo homem
natural possui este elemento e que o contém, porque a alma é a vida comum
compartilhada por todos os homens naturais. Antes da regeneração, tudo o que
forma parte da vida — seja o eu, a vida, a força, o poder, a decisão, o pensamento,
a opinião, o amor, o sentimento — pertence à alma. Em outras palavras, a vida
da alma é a vida que um homem herda ao nascer. Tudo o que esta vida possui e
tudo o que possa chegar a ser se encontra no reino da alma. Se reconhecermos
claramente o que é anímico, então nos será mais fácil reconhecer mais adiante o
que é espiritual. Será possível separar o espiritual do anímico.
A queda do homem
O homem que Deus formou era notavelmente diferente de todos outros seres
criados. O homem possuía um espírito similar ao dos anjos e ao mesmo tempo tinha
uma alma parecida com a dos animais inferiores.
Quando Deus
criou o homem, lhe deu uma liberdade total. Não fez do homem um autômato,
controlado automaticamente pela vontade de Deus. Isto é evidente em Gênesis 2,
quando Deus instruiu o homem original sobre qual fruta podia comer e qual não.
O homem que Deus criou não era uma máquina dirigida por Deus, pelo contrário,
tinha uma total liberdade de escolha. Se escolhia obedecer a Deus, podia
fazê-lo, e se decidia rebelar-se contra Deus, também podia fazê-lo. O homem
possuía uma soberania pela qual podia exercer sua vontade ao escolher entre
obedecer ou desobedecer. Este ponto é muito importante, posto que devemos ver
claramente que, em nossa vida espiritual, Deus jamais nos priva de nossa
liberdade. Deus não levará a termo nada sem nossa colaboração ativa. Nem Deus,
nem o demônio podem fazer nada através de nós sem antes ter obtido nosso
consentimento, porque a vontade do homem é livre.
Originalmente,
o espírito do homem era a parte mais nobre de todo seu ser, e a alma e o corpo
lhe estavam sujeitos. Em condições normais, o espírito é como um amo, a alma é
como um mordomo e o corpo é como um criado. O amo encarrega assuntos ao
mordomo, que, por sua vez, ordena ao criado que os execute. O amo dá ordens ao
mordomo em particular. O mordomo parece ser o dono de tudo, mas, na realidade,
o dono de tudo é o amo.
Por desgraça,
o homem caiu, foi derrotado e pecou, e em conseqüência se tergiversículou a
ordem correta do espírito, da alma e do corpo.
Deus outorgou
ao homem um poder soberano e concedeu numerosos dons à alma humana. Os mais
proeminentes são o pensamento e a vontade, ou o intelecto e a intenção. O
propósito original de Deus é que a alma humana receba e assimile a verdade e a
substância da vida espiritual de Deus. Deus deu dons aos homens para que o
homem pudesse receber o conhecimento e a vontade de Deus como deles. Se o
espírito e a alma do homem tivessem mantido sua perfeição, sanidade e vigor,
seu corpo teria sido capaz de manter-se sem mudança para sempre. Se tivesse
decidido em sua vontade pegar e comer a fruta da vida, é indubitável que a
própria vida de Deus teria entrado em seu espírito, teria impregnado sua alma,
teria transformado todo seu homem interior e teria passado seu corpo à
incorruptibilidade. Então teria estado literalmente de posse da vida eterna.
Nestas circunstâncias, sua vida anímica se encheria por completo de vida
espiritual e todo seu ser se teria transformado em algo espiritual.
Contrariamente, se se inverter a ordem do espírito e da alma, o homem submerge
nas trevas e o corpo humano não pode durar muito, mas sim logo se apodrece.
Sabemos que a
alma do homem escolheu a árvore do conhecimento do bem e do mal em lugar da
árvore da vida. Não obstante, não está claro que a vontade de Deus para Adão
era que comesse a fruta da árvore da vida? Porque antes tinha proibido a Adão
que comesse a fruta da árvore do bem e do mal e o advertiu que no dia que a
comesse morreria (Gen. 2:17). Primeiro ordenou ao homem que comesse livremente
de toda árvore do jardim, e propositalmente mencionou a árvore da vida no meio
do jardim. Quem pode dizer que não é assim?
«A fruta do
conhecimento do bem e do mal» eleva a alma humana e suprime o espírito. Deus
não proibiu o homem que comesse desta fruta simplesmente para prová-lo. O
proibiu porque sabia que, comendo desta fruta, a vida da alma do homem seria
tão estimulada que a vida de seu espírito ficaria submersa. Isto significa que
o homem perderia o autêntico conhecimento de Deus e em conseqüência estaria
morto para Ele.
A proibição
de Deus mostra o amor de Deus. O conhecimento do bem e do mal neste mundo é mau
em si mesmo. Este conhecimento surge do intelecto da alma do homem. Incha a
vida da alma e consequentemente rebaixa a vida do espírito até o ponto em que
esta perde todo conhecimento de Deus, até o ponto que fica como morto.
Um grande
número de servos de Deus vêem nesta árvore da vida, Deus oferecendo vida ao
mundo em seu Filho, o Senhor Jesus. Esta é a vida eterna, a natureza de Deus,
sua vida incriada. Por isso temos aqui duas árvores: a que produz vida
espiritual, enquanto que a outra gera vida anímica.
Em seu estado
original, o homem não é nem pecador nem santo e justo. Encontra-se entre os
dois. Pode aceitar a vida de Deus, convertendo-se assim em um homem espiritual
e participante da natureza divina, ou pode encher sua vida criada até torná-la
anímica, matando assim seu espírito.
Deus deu um
equilíbrio perfeito às três partes do homem. Sempre que uma das partes se
desenvolve muito, as outras sofrem.
Nossa
experiência espiritual será muito beneficiada se compreendermos a origem da
alma e seu princípio de vida.
Nosso
espírito vem diretamente de Deus, posto que é um dom de Deus (Nm. 16:22). Nossa
alma não tem esta procedência tão direta, foi produzida depois que o espírito
entrou no corpo. Por isso está vinculada ao ser criado, de uma maneira
característica. É a vida criada, a vida natural. O valor que tem a alma é
realmente grande, se mantiver seu papel de mordomo e permitir que o espírito
seja o amo. O homem pode então receber a vida de Deus e estar em conexão com o
Deus da vida. Se, ao contrário, este mundo anímico se encher, conseqüentemente
o espírito ficará reprimido. Todos os atos do homem ficarão limitados ao mundo
natural do criado, incapaz de unir-se à vida sobrenatural e incriada de Deus. O
homem original sucumbiu à morte porque comeu da fruta do conhecimento do bem e
do mal, desenvolvendo assim, de maneira anormal, sua vida anímica.
Satanás
tentou a Eva com uma pergunta. Sabia que sua pergunta estimularia o pensamento
da mulher. Se Eva tivesse estado sob o completo controle do espírito teria
rechaçado estas perguntas. Ao tentar responder, utilizou sua mente, em
desobediência ao espírito. É indubitável que a pergunta de Satanás estava cheia
de enganos, posto que seu motivo principal era simplesmente incitar a atividade
mental da Eva. Seria de se esperar que Eva corrigisse a Satanás, mas, ai!, Eva
se atreveu a trocar a Palavra de Deus em sua conversa com Satanás. Em
conseqüência, o inimigo se encorajou e a tentou para que comesse, sugerindo-lhe
que, ao comer, se lhes abririam os olhos e seria como Deus, conhecendo o bem e
o mal. «Assim, quando a mulher viu que a árvore era boa para comer e que era
uma delícia para os olhos, e que a árvore era desejável para ter sabedoria,
tomou de seu fruto e comeu» (Gn. 3:6). Assim foi como Eva viu o assunto.
Satanás provocou primeiro seu pensamento anímico e em seguida avançou até
apoderar-se de sua vontade. O resultado: Eva caiu no pecado.
Satanás
sempre utiliza a necessidade física como primeiro objetivo a atacar.
Simplesmente fez menção a Eva do ato de comer a fruta, um assunto totalmente
físico. A seguir tentou seduzir sua alma, dando-lhe a entender que, fazendo o
que lhe dizia, se lhes abririam os olhos para conhecer o bem e o mal. Embora
esta busca do conhecimento fosse totalmente legítima, sua consumação levou seu
espírito a uma franca rebeldia contra Deus, porque tergiversículou a proibição
de Deus, lhe atribuindo um propósito mau. A tentação de Satanás alcança
primeiro o corpo, em seguida a alma e finalmente o espírito.
Depois de ter
sido tentada, Eva deu sua opinião. Para começar, «a árvore era boa para comer».
Isto é «concupiscência da carne». A carne da Eva foi a primeira a ser
estimulada. Segundo, «era uma delícia para os Isto olhos é «a concupiscência
dos olhos». Agora já estavam estimulados seu corpo e sua alma. Terceiro, «a
árvore era desejável para dar sabedoria. Isto é «o orgulho da vida». Este
desejo revelava a vacilação entre sua emoção e sua vontade. A agitação de sua
alma era já incontrolável. Já não se mantinha à margem, como um espectador, mas
sim tinha sido cutucada a desejar a fruta.
Que perigosa
é uma emoção humana, quando é dona das circunstâncias!
Por que Eva
desejou a fruta? Não foi simplesmente pela concupiscência da carne e a
concupiscência dos olhos, mas sim também por sua incontida curiosidade pela sabedoria.
Na busca de sabedoria e de conhecimento, inclusive do chamado «conhecimento
espiritual», com freqüência se podem incentivar as atividades da alma.
Quando uma
pessoa tenta aumentar seu conhecimento praticando ginástica mental com livros,
sem esperar em Deus nem pedir a direção do Espírito Santo, é evidente que sua
alma se encontrará em plena oscilação. Isso esgotará sua vida espiritual. Como
a queda do homem foi ocasionada pela busca de conhecimento, Deus utiliza a
«insensatez da cruz» para «destruir a sabedoria dos sábios». O intelecto foi a
causa principal da queda; por isso, para salvar-se, terá que acreditar na
loucura da Palavra da cruz, em lugar de depender do intelecto. A árvore do
conhecimento fez que o homem caísse, e por isso Deus emprega o «madeiro da
loucura» (1 P. 2:24) para salvar almas. «Se algum entre vós se julga sábio
neste tempo, que se torne ignorante para poder ser sábio. Porque a sabedoria
deste mundo é insensatez para Deus» (1 Co. 3:18-20; ver também 1:18-25).
Tendo
repassado cuidadosamente o relato da queda do homem, podemos ver que, ao
rebelar-se contra Deus, Adão e Eva desenvolveram suas almas até o extremo de
deslocar seus espíritos e submergir-se nas trevas. As partes proeminentes da
alma são a mente, a vontade e a emoção do homem. A vontade é o órgão da decisão
e em conseqüência o dono do homem. A mente é o órgão do pensamento, enquanto
que a emoção é o do afeto. O apóstolo Paulo nos diz que «Adão não foi
enganado», indicando que a mente de Adão não estava em confusão naquele dia
fatídico. Quem fraquejou em sua mente foi Eva: «a mulher foi enganada e pecou»
(1 Tm. 2:14). Segundo o relato de Gênesis, está escrito que «a mulher disse: «A
serpente me enganou e comi» (Gn. 3:13). Mas «o homem disse: «A mulher me deu
(não me enganou) a fruta da árvore e comi» (Gn. 3:12). É evidente que Adão não
foi enganado. Sua mente estava limpa e sabia que a fruta era da árvore
proibida. Comeu por causa de seu efeito pela mulher. Adão compreendeu que o que
havia dito a serpente não era nada mais que o engano do inimigo. Das palavras
do apóstolo vemos que Adão pecou deliberadamente. Amava a Eva mais que a si
mesmo. Fê-la seu ídolo e por ela foi capaz de rebelar-se contra a ordem de seu
Criador. Que lástima que sua emoção dominasse a sua mente! Seu efeito superou a
sua razão.
Por que os
homens «não acreditaram na verdade»? Porque «sentiram prazer na injustiça» (2
Ts. 2:12). Não é que a verdade não seja razoável mas sim que não a amam. Por
isso quando alguém verdadeiramente vai ao Senhor, crê com o coração (não com a
mente) ele é justificado» (Rm. 10:10).
Satanás levou
Adão a pecar apoderando-se de sua vontade, através de sua emoção, enquanto que
tentou a Eva a que pecasse dominando sua vontade pelo caminho de uma mente
obscurecida. Quando a vontade e a mente e a emoção do homem foram envenenadas
pela serpente e o homem seguiu a Satanás em lugar de seguir a Deus, seu
espírito, que podia ter comunhão íntima com Deus, recebeu um golpe mortal. Aqui
podemos ver a lei que governa a obra de Satanás. Usa as coisas da carne (comer
fruta) para atrair a alma do homem para o pecado. Assim que a alma peca, o
espírito fica consumido em uma escuridão absoluta. A ordem de seu método sempre
é o mesmo: de fora para dentro. Se não começar pelo corpo, então começa trabalhando
com a mente ou a emoção para apoderar-se da vontade do homem. No momento em que
o homem cede diante de Satanás, este possui todo o ser do homem e mata o
espírito.
Mas não é
assim com a obra de Deus: Deus sempre trabalha de dentro para fora. Deus começa
trabalhando com o espírito do homem e prossegue iluminando sua mente,
estimulando sua emoção e o levando a exercer sua vontade sobre seu corpo, para
cumprir a vontade de Deus.
Toda obra
satânica se realiza de fora para dentro e toda obra divina se realiza de dentro
para fora. Nisto podemos distinguir o que vem de Deus e o que vem de Satanás.
Tudo isto nos ensina, além disso, que, uma vez que Satanás se apodera da
vontade do homem, controla esse homem.
Devemos ter
em mente que a alma é onde o homem expressa sua livre vontade e exerce sua
autoridade. Por isso a Bíblia freqüentemente deixa claro de que é a alma a que
peca. Por exemplo, Miquéias 6:7 diz «o pecado de minha alma». Ezequiel 18:4, 20
diz «a alma que peca». E nos livros Levitico e Números se menciona
freqüentemente que a alma peca. Por que? Porque é a alma que decide pecar.
Nossa descrição do pecado é: «A vontade de seu consentimento na tentação.»
Pecar é coisa
da vontade da alma e em conseqüência deve haver uma expiação pela alma.
«Dêem
oferenda ao Senhor para fazer expiação por suas almas» (Êx. 30:15).
«Porque a
vida da carne está no sangue, e lhe dei isso sobre o altar para fazer expiação
por suas almas, porque é o sangue que faz expiação pela alma» (Lv. 17:11).
«Para fazer
expiação por nossas almas diante de Jehová» (Nm. 31:50).
Como é a alma
que peca, depreende-se que a alma é a que tem que receber expiação. E além
disso a expiação deve proceder de uma alma:
«Foi da
vontade do Senhor esmagá-lo, fazendo-o enfermar... fará a sua alma uma oferta
pelo pecado... Ele verá o fruto do trabalho da sua alma, e ficará satisfeito...
derramou sua alma até a morte... e levou sobre si o pecado de muitos, e pelos
transgressores intercedeu». (Is. 53:10-12).
Ao examinar a
natureza do pecado do Adão, descobrimos que, além da rebelião, também há um
certo tipo de independência. Aqui não devemos perder de vista o livre-arbítrio.
Por um lado a árvore da vida implica um sentido de dependência. Naquele tempo o
homem não possuía a natureza de Deus, mas se tivesse participado da fruta da
árvore da vida teria obtido a vida de Deus e o homem teria podido alcançar seu
ápice: possuir a mesma vida de Deus. Isto é dependência. Por outro lado, a
árvore do conhecimento do bem e do mal sugere independência, porque o homem
procurou por meio do exercício de sua vontade, obter o conhecimento que não lhe
tinha sido prometido, algo que Deus não lhe tinha concedido. Sua rebelião
declarava sua independência. Rebelando-se, não tinha que depender de Deus. Além
disso, sua busca do conhecimento do bem e do mal também mostrava sua
independência, porque não estava satisfeito com o que Deus já lhe tinha
concedido. A diferença entre o espiritual e o anímico é clara como o cristal. O
espiritual depende totalmente de Deus, está plenamente satisfeito com o que
Deus dá. O anímico evita qualquer contato com Deus e ambiciona o que Deus não
concedeu, em especial «o conhecimento». A independência é uma marca especial do
anímico. Isto — não importa quão bom seja, inclusive quando adora a Deus — é
indubitavelmente costume da alma não requerer uma confiança completa em Deus e,
em troca, exige dependência da própria força. A árvore da vida não pode crescer
dentro de nós junto com a árvore do conhecimento. A rebelião e a independência
explicam todo pecado cometido tanto pelos pecadores como pelos santos.
O espírito, a
alma e o corpo depois da
queda
Adão vivia pelo fôlego de vida que se fez espírito nele. Por meio do
espírito, recebia Deus, conhecia a voz de Deus e tinha comunhão íntima com
Deus. Era profundamente consciente de Deus. Mas, depois da queda, seu espírito
morreu.
Quando Deus
falou com Adão, antes de mais nada lhe disse: «o dia em que dela comer (a fruta
da árvore do bem e do mal) morrerá» (Gn. 2:17). Mesmo assim, Adão e Eva viveram
centenas de anos depois de ter comido a fruta proibida. Evidentemente, isto
indica que a morte que Deus tinha anunciado não era física. A morte de Adão
começou em seu espírito.
O que é
realmente a morte? Segundo a definição científica, a morte é «o afastamento da
comunicação com o meio ambiente». A morte do espírito é o afastamento de sua
comunicação com Deus.
A morte do
corpo é a interrupção da comunicação entre o espírito e o corpo. Assim, quando
dizemos que o espírito está morto, não implica que já não haja espírito. Só
queremos dizer que o espírito perdeu sua sensibilidade para Deus e por isso
está morto para Ele. A situação exata é que o espírito está incapacitado, é
incapaz de ter comunhão íntima com Deus. Exemplificando: Uma pessoa muda tem
boca e pulmões, mas há algo que falta em suas cordas vocais que o impede de
falar. No que se refere à linguagem humana, sua boca pode ser considerada
morta. De igual maneira, o espírito de Adão morreu por causa de sua
desobediência a Deus. Ainda tinha seu espírito, mas estava morto para Deus
porque tinha perdido seu instinto espiritual. E continua sendo assim. O pecado
destruiu o profundo conhecimento intuitivo que o espírito tinha de Deus e tem
feito o homem espiritualmente morto. Pode ser religioso, moral, erudito, capaz,
forte e sábio, mas está morto para Deus. Inclusive pode falar de Deus,
raciocinar a respeito de Deus e pregar sobre Deus, mas continua estando morto
para Ele. O homem não pode ouvir ou perceber a voz do Espírito de Deus. Em
conseqüência, Deus, no Novo Testamento, chama freqüentemente mortos aos que
estão vivos na carne.
A morte que
começou no espírito de nosso antepassado se estendeu gradualmente até alcançar
seu corpo. Embora vivesse muitos anos depois de seu espírito ter morrido, mesmo
assim a morte trabalhou sem cessar nele até que morreram seu espírito, sua alma
e seu corpo. Seu corpo, que poderia ter sido transformado e glorificado, em vez
disso voltou para o pó. Como seu homem interior tinha caído no caos, seu homem
exterior devia morrer e ser destruído. Após o que, o espírito de Adão (assim
como o espírito de todos seus descendentes) caiu sob a opressão da alma, e,
pouco a pouco, se fundiu com a alma e as duas partes ficaram fortemente unidas.
O escritor de Hebreus afirma em 4:12 que a Palavra de Deus transpassará e
separará a alma e o espírito. A separação é necessária porque o espírito e a
alma se tornaram um. Enquanto estão intimamente unidos, submergem o homem em um
mundo físico. Tudo se faz seguindo os ditados do intelecto ou do sentimento. O
espírito perdeu seu poder e sua sensibilidade, como se estivesse totalmente
adormecido. O instinto que ainda tenha para conhecer e servir a Deus está
completamente paralisado. Permanece em coma, como se não existisse. É a isto
que se refere Judas 19 quando diz «natural, sem espírito» (literal).* Claro está que isto não significa
que o espírito humano deixe de existir, porque Números 16:22 afirma claramente
que Deus é «o Deus dos espíritos de toda carne». Todo ser humano continua
possuindo um espírito, embora esteja obscurecido pelo pecado e impotente para
ter comunhão com Deus.
Embora este
espírito esteja morto para Deus, pode permanecer tão ativo como a mente ou o
corpo. Deus o considera morto, mas ainda é muito ativo em outros aspectos. Em
algumas ocasiões, o espírito de um homem caído pode inclusive ser mais forte
que sua alma ou seu corpo, e pode conseguir o domínio sobre todo o ser. Estas
pessoas são «espirituais», da mesma maneira que a maioria das pessoas são
anímicas ou físicas em sua major parte porque seus espíritos são maiores que os
das outras pessoas. Estes são as bruxas e os feiticeiros. É certo que mantêm
contato com o mundo espiritual, mas o fazem por meio de espíritos diabólicos,
não pelo Espírito Santo. Deste modo, o espírito do homem caído se alia com
Satanás e seus espíritos diabólicos. Está morto para Deus, mas certamente muito
vivo para Satanás e segue aos espíritos diabólicos que trabalham nele.
Ao ceder às
exigências de suas paixões e desejos carnais, a alma se converteu em escrava do
corpo, de maneira que o Espírito Santo não tem oportunidades para lutar com o
objetivo de recuperá-la para Deus. Por isso a Bíblia afirma: «O meu Espírito
não permanecerá para sempre no homem, porquanto ele é carne» (Gn. 6:3). A
Bíblia diz da carne que é a combinação da alma não regenerada e da vida física,
embora a maioria das vezes assinale o pecado que está na carne. Uma vez que o
homem está sob o domínio da carne, não tem nenhuma possibilidade de
libertar-se. A alma substituiu à autoridade do espírito. Tudo se faz
independentemente e segundo os ditados de sua mente. Inclusive em assuntos
religiosos, na mais apaixonada busca de Deus, tudo se leva a cabo com a força e
a vontade da alma do homem, carente da revelação do Espírito Santo. A alma não
é simplesmente independente do espírito, mas, além disso, está sob o controle
do corpo. Lhe pede que obedeça, que execute e que satisfaça os desejos carnais,
as paixões e as demandas do corpo. Assim, todo filho de Adão não só está morto
em seu espírito, mas sim também é «da terra, um homem do pó» (1 Co. 15:47).
Os homens caídos estão sob o domínio total da carne, atuando em resposta
aos desejos de sua vida anímica e de suas paixões físicas. São incapazes de ter
comunhão íntima com Deus. Às vezes desenvolvem seu intelecto, em outras
ocasiões sua paixão, mas o mais freqüente é que desenvolvam tanto seu intelecto
como sua paixão. Sem empecilhos, a carne controla firmemente o homem todo.
Isto é o que
se expõe no Judas 18 e 19: «escarnecedores, andando segundo as suas ímpias
concupiscências.. Estes são os que causam divisões; são sensuais, e não têm o
Espírito.». Ser anímico é contrário a ser espiritual. O espírito, nossa parte
mais nobre, a parte que pode unir-se a Deus e que deveria governar a alma e o
corpo, agora está sob o domínio da alma, essa parte de nós que é mundana em
seus motivos e em suas metas. O espírito foi destituído de sua posição
original. A condição atual do homem é anormal. Por isso é descrito como se não
tivesse espírito. O resultado de ser anímico é tornar-se escarnecedor,
perseguir paixões ímpias e criar divisões.
1 Coríntios
2:14 fala destas pessoas não regeneradas da seguinte maneira: «O homem natural
(anímico) não recebe os dons espirituais de Deus porque para ele são loucura, e
não pode compreendê-los porque se discernem espiritualmente.» Estes homens se
encontram sob o controle de suas almas e com seus espíritos reprimidos
contrastam totalmente com as pessoas espirituais. Podem ser portentosamente
inteligentes, capazes de apresentar idéias e teorias com autoridade, mas não
admitem as coisas do Espírito de Deus. Não estão capacitados para receber a
revelação do Espírito Santo. Esta revelação é absolutamente diferente das
idéias humanas. Os homens podem pensar que o intelecto e o raciocínio humanos
são todo-poderosos, que o cérebro pode compreender todas as verdades do mundo,
mas o veredicto da Palavra de Deus é: «vaidade de vaidades».
Enquanto o
homem está em seu estado anímico freqüentemente percebe a insegurança desta
vida e em conseqüência busca a vida eterna do mundo vindouro. Mas, se o faz,
continua sem poder desvelar a Palavra de vida com seus muitos raciocínios e
teorias. Quão pouco dignos de confiança são os raciocínios humanos!
Com freqüência
observamos como pessoas muito inteligentes se chocam em suas diferentes
opiniões. As teorias conduzem o homem facilmente ao engano. São castelos
no ar que o afundam na escuridão eterna.
Quão certo é
que, sem a direção do Espírito Santo, o intelecto não somente é pouco
confiável, mas também é extremamente perigoso, porque freqüentemente
confunde o bom e o mau. Um ligeiro descuido pode provocar, não simplesmente uma
perda temporária, mas inclusive um dano eterno. A mente obscurecida do homem
freqüentemente o leva à morte eterna. Se as almas não regeneradas pudessem ver
isso, que bom seria!
No entanto o
homem carnal pode controlar outra coisa além da alma: também pode estar sob a
direção do corpo, porque a alma e o corpo estão fortemente entrelaçados. Como o
corpo do pecado abunda em desejos e paixões, o homem pode cometer os pecados
mais espantosos. O corpo vem do pó e por isso sua tendência natural é
para a terra. A introdução do veneno da serpente no corpo do homem converte
todos seus desejos legítimos em desejos carnais. Uma vez que a alma cedeu
diante do corpo, ao desobedecer a Deus, encontra-se obrigada a ceder sempre. Os
baixos desejos do corpo podem desse modo expressar-se através da alma. O poder
do corpo se torna tão entristecedor que a alma não pode fazer outra coisa que
converter-se em uma escrava obediente.
O plano de
Deus para o espírito era que tivesse a preeminência, que governasse nossa alma.
Mas uma vez que o homem se torna carnal, seu espírito fica escravizado à alma.
A degradação aumenta quando o homem se torna «corporal» (do corpo), porque o
corpo, que é mais baixo, sobe até ser o soberano.
Então o homem
desceu do «controle do espírito» ao «controle da alma», e do «controle da alma»
ao «controle do corpo». Cada vez se afunda mais e mais. Que lamentável é quando
a carne consegue o domínio.
O pecado deu
morte ao espírito: por isso a morte espiritual alcança a todos, porque todos
estão mortos em pecados e transgressões. O pecado tornou a alma independente:
em conseqüência a vida anímica não é mais que uma vida egoísta e obstinada.
Finalmente o pecado deu plenos poderes ao corpo: por conseguinte, a natureza
pecadora reina por meio do corpo.